quinta-feira, 27 de outubro de 2022

INFINITUDE E PASSAGEM

 

Uma homenagem aos 30 anos como membro associado da SOBRAMES SP, degustando o maravilhoso sabor de sua história.

 

Quanto tempo se passou desde o último sorriso franco, quando a sombra da tristeza ainda não se espalhava sob o manto estelar?

A vida de então era feita da ilusão de potência e de momentos sem escassez de sonhos, uma dança lenta que se fazia ao sabor das circunstâncias, tal o minueto da realeza que exibe seu manto com adornos de brilho e destaque para ser apreciado.

O passar vagaroso de um tempo infinito ainda permitia a tudo corrigir, porque o caminho, longo e farto, não contabilizava horas com pensamentos e reflexões, apenas com um sentir de infinitude que palpitava eternidade.

Se as colheitas não eram imediatas, pelo menos se mostravam promissoras e a roda da fortuna trazia convites e imensas possibilidades. Inesgotáveis, atraentes, sedutoras. Disperso em brilho e aromas adocicados e cítricos, tudo se apresentava como percurso perfumado que oferecia acesso ao pomar generoso de todas as coisas.

Quanto tempo se passou desde que a natureza decidiu podar os fartos galhos das árvores, deixando crescer vegetação selvagem nos frescos jardins, fazendo com que os raios de sol lutassem para penetrar seu brilho em dias antes recheados de promessas alvissareiras?

Primavera, verão, outono, inverno. O tempo passou, lavando ilusões que desbotaram com a cor de cada cenário. A vida seguiu seu curso a enumerar estações que se alternaram enquanto o tempo escoava alegria no ralo sideral de toda passagem.

Sucessivos dias de silêncio retumbaram no futuro não planejado. E o porvir, que parecia nunca chegar, transformou o presente de palavras elegantes em rascunhos adormecidos e livros empoeirados que mesmo assim insistiram em seu valor.

No entanto, aquilo que sobrevém encontra os que sobrevivem.

As sombras do dia começam a se desfazer com a realidade das constatações; as paisagens, antes reconhecidas com a vã garantia das certezas, foram se exibindo totalmente diferentes e sem o apelo de outrora, insípidas e quase indiferentes.

Todavia, outros campos começaram a se vestir de cor e luz. Novos plantios vão resultar em colheitas que convidarão ao desfrute do sabor e ao langor de dias fartos e cheios de promessas. Tudo se faz caminho onde tudo era apenas passagem.

Na história da vida, o movimento das mudanças é constante para a necessária transformação. Ansiedades se refrigeram com novos pensamentos e o coração finalmente encontra a paz da alma liberta.

De novo, existe um começo para suavizar vivências sentidas em perdas.

De tesouro, existem lembranças a preencher os dias, fotografias a preencher estantes, saudade a preencher vazios e uma dose de destilado ou fermentado a inebriar antigos apelos.

Contudo, a pizza saindo do forno espera o bonde do desejo assegurar assento no apetite voraz que sucede cada brinde. É a vez de a poesia colher os frutos de uma boa prosa, enquanto o retrato de Oscar Freire simula, na solidão de uma pizzaria em seu réquiem aeternam, um aceno aos colegas escritores, convidando-os a seguir sua estrada.

E, na Paulista, os semáforos continuam a alternar as cores de uma nostalgia feita de retalhos de vozes e sorrisos: pare, olhe e siga festejando o que se foi e o que virá.

Um outdoor exibe Carlitos convidando ao sonho da ribalta entre as luzes da cidade.

Novo cenário. Nova cena. Nova claque.

E tudo seguirá seu curso, ainda que por outros caminhos...

 

JOSYANNE RITA DE ARRUDA FRANCO

Segundo Lugar Prosa XVI Jornada Médico-Literária SOBRAMES SP

 

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