quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

A ESCOLA PARA ASSALTANTES




Por: Helmut Adolf Mataré
ANESTESIOLOGIA
(in memoriam)
1917-2016

O sistema carcerário brasileiro é uma academia de crimes. Os batedores de carteira são profissionais. Existe um brasileiro que nunca teria ouvido estas opiniões? O mais importante é a instrução oficial: “Não reaja, se for assaltado, porque o assaltante está sob tensão nervosa. Ele pode assustar-se e  exagerar na violência”.

Esta é a opinião que os delegados da polícia representam, de acordo com a experiência deles, porque eles anotam as ocorrências. Eles analisam cada caso com vista aos possíveis desdobramentos e avaliam os perigos que um assalto conjura. 

A grandeza do perigo exprime-se em porcentagem, de acordo com as regras da estatística. A  pergunta é: com que probabilidade acontece o efeito em apreço, se está presente a condição desencadeante?

Este modelo de pensamento vale na física, na tecnologia, na astronomia e meteorologia, mas não vale (nesta forma simples) na psicologia, porque o ser humano é capaz de aprender. Nenhum criminoso faz somente uma tentativa de seqüestro ou de assalto em sua vida. Quando ele está na fase da experiência, seu modo de agir e de reagir pode mudar em cada caso. Não é só a experiência que modifica a reação do criminoso, mas também seu estado alimentar, sua vigília, bem como as oscilações do caráter, freqüentemente causadas por substâncias psicotrópicas.

De suma importância para o assaltante é a previsão que ele se faz sobre a reação da vítima. Quanto mais pacífica a vítima, tanto maior a tentação de proceder ao assalto. Criminosos têm orgulho e espírito corporativo. Muitos formam uma organização atuante e disciplinada. Para os líderes destas corporações não existe maior triunfo que um regulamento público que proíbe as vítimas de se defenderem. Orgulhosos eles podem declarar uma Guerra Santa contra a má distribuição da renda, sem perigo de baixa em suas fileira, matando à vontade.

A advertência dos delegados de polícia que nenhum cidadão deve defender-se, criou um quarto poder público. Ao lado dos poderes executivo, judiciário e legislativo, temos agora o poder dos assaltantes.

O famigerado “movimento contra a violência” dá sua bênção a cada roubo ou seqüestro que decorre sem algazarra, porque poupou-se o mais precioso que existe, a vida humana. Certamente, a vida humana é um grande valor, mas não é o único valor. A vida da mãe terra, por exemplo, ultrapassa em valor uma vida humana. E existe ainda uma moral que conhece muitos outros  valores e que coloca o valor da vida de um criminoso num escalão inferior ao da vida de um cidadão honesto.

A moral obriga-nos a educar-nos mutuamente. A permissividade, a conivência com crimes são atitudes imorais. Ainda que uma vida humana esteja em jogo, não se extingue o dever de pugnar contra o crime e de fazer tudo que é em nosso poder, para desestimular os criminosos ou para ajudar a puni-los. A sociedade que ignora estas imposições morais transforma-se em gigantesca academia de crime.

Se a polícia acha que não convém que os cidadãos dêem lições aos criminosos, ela deveria armar ciladas em todos os pontos críticos (coisa que é impraticável) e imediatamente abaixaria o número de assaltos e seqüestros.

Nunca na história da humanidade existia um povo que prescindia do princípio da expiação do crime, mas nossa democracia permite aos partidos políticos propaganda demagógica que coloca a moralidade ao segundo plano, em benefício da promessa de comodidade e de conforto imediato.

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