quinta-feira, 26 de setembro de 2019

NINHO PERDIDO

Por: Mário Santoro Junior
PEDIATRIA

       O seu consultório era no andar alto de um prédio, no centro de um bairro nobre da cidade. Ali ela trabalhava diuturnamente, em período integral. Meses antes dos fatos aqui narrados, caro leitor, ela resolvera substituir o sistema de ar condicionado do consultório. Modernos aparelhos foram instalados, muito mais eficientes do que aqueles antigos que ali estavam, modelo dito de parede. Não obstante resolvera, também, mantê-los no local, pois sua remoção exigiria um esforço a mais. Com o passar dos dias começou a perceber ruídos que, ao que parecia, vinham daqueles dispositivos, agora não mais funcionantes. Ruídos estes que foram rapidamente aumentando em intensidade, dando a perceber que era chilrada de pássaros. Verdadeira algazarra a ponto de atrapalhar o atendimento de seus pacientes, pois, médica atenciosa, era bastante diligente em suas funções. Por diversas vezes tentou afugentá-los, mas sem sucesso. Concluiu que era necessário remover as referidas máquinas. Aproveitou uma semana em que por ter que atender outro compromisso não estaria no consultório. Contratou profissionais que retiraram o velho e desgastado aparelho e em seguida repararam a parede além de terem efetuado o novo revestimento dela.
Na data aprazada voltou às suas atividades e gostou do que viu. Porém notou que ao final da tarde, todos os dias, no parapeito de sua janela surgiam três passarinhos que, como espreitando para dentro do consultório, rapidamente fugiam quando ela se aproximava deles. Foi então que lembrou de haver tido sido informada de que, quando da retirada do velho aparelho, havia um ninho de pássaros contendo estes três ovos. Assim, pensou, estariam eles a procura do ninho perdido?
  Num dia em que estava particularmente alegre, pois mais um neto havia chegado à sua família – e a chegada de um neto representa a vida que se pereniza por meio de nossos descendentes- percebeu, como sempre ao final da tarde, que os três passarinhos estavam no parapeito da sua janela. Foi então que ela notou que eles não mais piavam. Tristeza profunda pensou, a ponto de calarem seu canto? E, de repente, afloraram do mais profundo de seu inconsciente sentimentos confusos, uma mistura de culpa, dor e arrependimento. Teria ela sido a causa do que para ela pareceu ser uma tragédia?
Rapidamente lágrimas furtivas rolaram na sua face e ela se prostrou diante da imagem da Santa de sua devoção, imagem que há muitos anos a acompanhava. Baixinho orou e pediu perdão a Deus.
Na tarde seguinte e em muitas outras que se sucederam ela não mais os viu em sua janela.
Aos poucos ela, então, compreendeu sua mensagem.

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